Busca por crédito continua firme
O déficit habitacional do país continua alavancando a demanda por imóveis populares. Segundo instituições financeiras consultadas, o financiamento de imóveis avaliados em até R$ 500 mil apresenta incremento das operações de crédito em 2014, com expectativa positiva para 2015. Já os empréstimos para a pessoa jurídica têm registrado queda. Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) estima que os bancos emprestem R$ 125,6 bilhões para financiamentos imobiliários em 2014. Os recursos são oriundos da caderneta de poupança. O volume é 15% superior aos R$ 109 bilhões emprestados em 2013. A previsão é que neste ano sejam financiados 582 mil imóveis residenciais, 35,6% a mais do que as 429 mil unidades financiadas por bancos no ano passado.
O Bradesco estima crescimento acima de dois dígitos, superior à previsão do banco para o crédito geral da instituição, que é de 10% a 14%. "O déficit habitacional existente, o baixo desemprego, a elevação da renda das pessoas, a estabilidade da economia e a simplificação do processo de contratação das operações são fatores que nos fazem acreditar nesse crescimento acima de dois dígitos", afirma o diretor de crédito imobiliário do Bradesco, Cláudio Borges.
Para o diretor da área de crédito imobiliário do Itaú Unibanco, Luiz França, em 2014 o setor não terá um crescimento do crédito imobiliário tão forte como no ano anterior. "Mesmo o segundo semestre, que costuma ser mais aquecido para os empréstimos imobiliários, não deve alcançar números da segunda metade de anos anteriores, em função do período de eleição."
"A procura do primeiro imóvel para morar, até RS 500 mil, não vai ceder neste ano e nem em 2015. Há muitas famílias entrando no mercado, precisando de residências. O cenário é de crescimento para o segmento de imóveis populares", afirma o diretor-executivo de negócios imobiliários do Santander, Gilberto Abreu. Por outro lado, deve diminuir o número de venda de imóveis de R$ 1 milhão a R$ 1,5 milhão, voltados à classe média, que está migrando para o segundo imóvel. Este público posterga a decisão e foi a área mais abastecida nos últimos cinco anos.
Segundo ele, no segmento de pessoa jurídica, os empréstimos em 2014 são inferiores aos do ano pas¬sado e a expectativa é de que em 2015 o crescimento seja na mesma base de 2014. Isso acontece porque as construtoras estão pegando menos empréstimos, há menos investidores comprando e menos imóveis de R$ 1 milhão a R$ 1,5 milhão sendo vendidos. "Este momento de estabilidade é saudável para as construtoras, porque permite a previsibilidade de estoque, de demanda, sem guerra de preços."
No Brasil, a principal fonte para o financiamento imobiliário continua sendo os recursos da caderneta de poupança. Em 2014, a alta da inflação, o nível de endividamento das famílias e a opção por outros tipos de investimento com melhor remuneração por conta do aumento da taxa Selic contribuíram para a queda no volume de entrada de recursos na poupança. Ainda assim, a captação líquida é representativa. Em 2013, somou R$ 54 bilhões. Nos oito primeiros meses de 2014, o valor líquido captado alcançou R$ 12 bilhões. Por volta de 60% do valor captado é destinado ao financiamento imobiliário. O saldo total acumulado na poupança está em torno de R$ 500 bilhões.
Outros instrumentos, como o Certificado de Recebíveis Imobiliário (CRI), a Cédula de Crédito Imobiliário (CCI) e a Letra de Crédito Imobiliário (LCI), são opções que se juntam à poupança para financiar o crédito imobiliário, especialmente para empreendimentos de pessoas jurídicas. Hoje, os bancos estão apostando mais na LCI por haver demanda da pessoa física pelo título, com isenção de imposto de renda sobre os ganhos obtidos. Além disso, se o banco emissor do título quebrar, o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) garante o valor de até R$ 250 mil. O volume da LCI depositado na Cetip - companhia responsável pelo registro, depósito, negociação e liquidação do título - aumenta a cada ano. Passou de R$ 29,2 bilhões em dezembro de 2010 para R$ 96,5 bilhões em agosto deste ano.
No fim de agosto, o governo anunciou algumas medidas, entre elas a criação da Letra Imobiliária Garantida (LIG), instrumento por meio do qual os bancos poderão captar recursos para operações imobiliárias. Quando a medida for regulamentada, o novo título será uma fonte alternativa para a captação de recursos. Sendo a LCI mais acessível à pessoa física, principalmente por conta da garantia oferecida, os bancos captam mais por meio dela para as operações de financiamento. No entanto, o custo é superior ao da captação pela poupança. O financiamento de residências no segmento popular, com recursos oriundos da poupança, tem taxa de juro mais atrativa.
Em média, o tomador do empréstimo paga taxa de 9% a 9,3% ao ano, acrescida da Taxa Referencial (TR). O percentual final vai depender do relacionamento do cliente com o banco, do volume emprestado e da classificação de risco da pessoa. A estabilidade da taxa de juro do financiamento também se deve à competição acirrada entre os bancos.
O Banco do Brasil (BB) pratica taxas que vão de 4,59% ao ano, dentro do programa Minha Casa, Minha Vida, até 9,3% ao ano para as operações com dinheiro captado pela poupança. "Como fontes de recursos, a poupança e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) permitem as menores taxas entre as linhas de crédito imobiliário disponíveis no país, independentemente da variação da Selic", afirma o diretor de crédito imobiliário do BB, Hamilton Rodrigues da Silva.
A demanda é muito maior do que se produz de moradias. Por ano, se forma 1,3 milhão de famílias no Brasil, sendo a maior parte da base da pirâmide social. Desde sua criação, o programa Minha Casa, Minha Vida con¬tratou, em média, 700 mil unidades por ano. Se a pessoa está empregada, compra o imóvel por necessidade. A prestação da casa própria no programa pode ser menor do que o valor do aluguel.
"A demanda pela aquisição do primeiro imóvel e o volume de financiamentos imobiliários, quando com¬parado ao Produto Interno Bruto (PIB), sinalizam crescimento em 2014 e 2015, com capacidade de pagamento das prestações pela pessoa física", diz Silva.
Os profissionais dos bancos consultados são unânimes em dizer que a inadimplência no crédito imobiliário não acompanha os percentuais verificados em outros tipos de crédito ao consumidor. Segundo dados da Abecip, o atraso nas prestações de financiamento imobiliário tem taxa de inadimplência média de 1,8% desde 2012. Na Caixa, por exemplo, a inadimplência na carteira de crédito imobiliário tem se mantido entre 1,3% e 1,6% em relação ao total da carteira de financiamentos.
O percentual de inadimplência no crédito imobiliário é menor, principalmente, por conta da entrada na compra da casa. Em média, a pessoa paga à vista 40% do valor do imóvel para financiar o restante. Também no financiamento imobiliário há o contrato de alienação fiduciária do imóvel, que transfere a posse do bem ao credor se não houver o pagamento das parcelas do financiamento.
Em 2013, a Caixa emprestou R$ 135 bilhões para a compra de imóveis (residencial, comercial, incluindo o programa Minha Casa, Minha Vida). O volume de re¬cursos emprestados para imóveis comerciais não passa de 3%. "Crescer em cima de uma base tão grande não é fácil. Temos superado metas todos os anos. Em 2014, o crescimento máximo previsto pode ser inferior ou até o máximo de 10% sobre o ano anterior", diz o diretor de habitação da Caixa, Teotônio Rezende. Para 2015, há a expectativa de aumento do volume de empréstimos em 10%. Entre 2013 e 2014, a Caixa tem fechado uma média de cinco mil contratos de financiamentos imobiliários por dia.
"A habitação social continua sendo prioridade. As condições de 2015 serão parecidas com as de 2014. A maior fatia, 94% do déficit habitacional, está concentrada em quem ganha até cinco salários mínimos", afirma Rezende. "O financiamento de uma residência é a troca do aluguel pela prestação da casa. Prestação é upgrade, e não aumento do endividamento." Segundo ele, a dívida a ser paga pelos tomadores de crédito imobiliário na Caixa (saldo total da carteira) soma R$ 300 bilhões. Na instituição, 50% para financiamento imobiliário é funding da poupança e 50%, do FGTS.
Em julho, a Caixa registrou aproximadamente sete milhões de acessos no site na área de imóveis. Entre o público visitante, 45% têm idade entre 26 e 35 anos. A estimativa de renda é de R$ 3 mil. Para 42% dos visitantes, o valor do imóvel mais procurado no site, nos últimos três meses, fica entre R$ 100 mil e R$ 150 mil.
O governo, no fim de agosto, também anunciou medidas de longo prazo para a construção. Uma delas é a permissão para que um pequeno percentual dos depósitos de poupança (3%) possa ser aplicado em novos financiamentos imobiliários garantidos por imóveis quitados e com escritura definitiva, em operações designadas como home equity.
Outra medida é a concentração de ônus nas matrículas dos imóveis, para reduzir o tempo despendido com a burocracia nas operações de crédito imobiliário. O mercado espera que as medidas sejam regulamentadas ainda neste ano. Por enquanto, elas estão na fase de discussão. E, quando publicadas, não terão efeito rápido. Vão favorecer o crescimento das operações de financia-mento imobiliário no médio e longo prazos.
Data: 16/10/2014